Texto: Alexandre Freire. Edição: Sérgio Maggio (Ascom Secec)
28/04/2022
14:44:32
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O Museu Nacional da República (MUN) abre três novas exposições nesta sexta-feira (29.4). Pedro Gandra vai dividir com Isabela Couto a Galeria Térreo. As duas mostras – respectivamente “Paraíso sem Vocabulário” e “Guardadora de Água” – são individuais, mas trazem em comum interlocuções dos dois trabalhos com textos da poeta gaúcha Mar Becker. A Sala 2 receberá a coletiva “Para Onde Foi a Espessura da Carne?”, com 39 artistas. Esse conjunto fica em cartaz até 26.6
Outras duas exposições continuam: na Galeria Principal, “Xingu 57: viagem ao Brasil Central”, com fotografias de Domiciano Dias, e no Mezanino, “Envenenada: profanações e polimorfismo tonais”, de Raquel Nava. As duas ficam até 22.5.
“O Museu Nacional da República tem atraído público intenso com exposições de qualidade. No aniversário de Brasília, de 19 a 24 de abril, tivemos mais de 5 mil visitantes”, aponta o secretário de Cultura e Economia Criativa, Bartolomeu Rodrigues.
FOGO CRIATIVO
A exposição “Paraíso sem Vocabulário” define-se por “paisagens pensadas como cenários que podem se apresentar elusivos ou eventualmente inóspitos. Habitam esses cenários ou ‘paisagens cenários’ representações de figuras, ocasionalmente antropomórficas (criadas a partir de memória ou imagens de arquivo) e etéreas, que se apresentam quase sempre solitárias”.
Carioca radicado em Brasília, Pedro Gandra dedica-se à pintura. “Venho desenvolvendo minha pesquisa, estabelecendo pontes com interesses variados e buscando formar um vocabulário visual a partir de signos e referências diversas, forjando a construção de um imaginário”.
Na mostra de Gandra, Mar Becker assina o ensaio poético “O Rosto, Sumidouro”, sobre a mostra. Ela conta que “se debruçou sobre as imagens desenvolvidas pelo artista visual e em referências caras às pesquisas de ambos, gerando um diálogo experimental e horizontal”.
O fogo é um elemento poético presente na obra do pintor e da poeta. “Com Mar Becker, estabeleci uma troca muito profícua, temos muitos interesses em comum, lugares onde o meu projeto encontra o dela. Sou um grande admirador do trabalho que ela vem desenvolvendo em poesia. É um privilégio tê-la neste projeto”, declara Pedro.
“Há mesmo essa interlocução, não com fins de ‘esclarecer’ ou oferecer chave de leitura para o trabalho de Gandra, mas muito mais pela via de um irmanamento como artista, no que a palavra poética pode tocar também esse lugar de enigma de ‘Paraíso sem Vocabulário’”, aponta Mar, formada em filosofia e especialista em epistemologia e metafísica.
ÁGUA FEMININA
Em “Guardadora de Água”, a artista visual Isabela Couto apresenta aquarelas e vídeos. Esses trabalhos mais recentes refletem evocações de um corpo num território, nesse caso entre Santiago, no Chile, e a Praia do Forte, no litoral norte da Bahia. O título é inspirado no poema “O Guardador de Água”, de Manuel de Barros. Nos trabalhos, os elementos água e névoa são uma constante.
Isabela diz que sua “investigação se inscreve na relação entre seres vivos (humanos, animais, plantas) e fenômenos naturais (vento, tempo, espaço) a partir do trajeto, da viagem”.
Na viagem de “Guardadora de Água”, a temática do feminino também parece emergir do inconsciente da artista num dos trabalhos expostos, quando uma alusão à Cordilheira dos Andes, feita com o cobertor embolado ao pé da cama, num quarto, durante o percurso, sugere a forma de um clitóris.
“Algumas pessoas que viram essa obra apontaram a semelhança com a genitália. Não foi intencional, foi uma coisa que aconteceu e que já aconteceu outras vezes. É algo que não controlo, que surge. Tem a ver com quarto, com cama, com o corpo, com o feminino”, explica Isabela.
A exposição do trabalho dessa brasiliense radicada em Salvador também se faz acompanhar de ensaio poético inédito de Mar Becker, “Nem a Nuvem do Dizível”. No texto, a gaúcha “reverbera, sobretudo, as aquarelas de paisagem de cobertor”. Para a escritora, é pela imagem da água que seu trabalho se irmana ao de Isabela Couto.
“Do mesmo modo, me parece que beiramos também sempre um perigo de perda de si: afinal, no dilúvio, os corpos podem erodir e se confundirem uns aos outros, a casa e as mulheres (tanto eu quanto ela trabalhamos muito com intimidade de mulheres, meninas) podem vir a se tornarem lodosas, indiscerníveis”, conjectura a poeta.
CORPOS COLETIVOS
Nas novas exposições no MUN, as referências a corpos – que surgem apenas sugeridas no trabalho de Pedro e furtivamente saltam do inconsciente de Isabela – tornam-se o eixo da coletiva organizada por Suyan de Mattos a partir da pergunta “Para Onde foi a Espessura da Carne?”.
“Convidei artistas que trabalham com pintura, não necessariamente com tinta, mas com o elemento pictórico. Então tem pintura, gravura, bordado, pintura digital. Pedi que respondessem com uma obra”, explica Suyan, que migrou da pintura para o bordado.
Uma leitura das respostas contidas nas obras, segundo a pesquisadora da arte, com pós-doutorado na área, “é que muita gente está se preocupando com uma beleza, com uma estética e adoecendo nessa busca”. Esse adoecimento, aponta Suyan, é do corpo, mas também da alma. São 39 artistas e “respostas” – incluindo ela – entre brasileiros e gente de fora – Cuba, México, Argentina e Inglaterra.
A bacharel em teoria e história da arte pela Universidade de Brasília (UnB) e crítica Gisele Lima trata das indagações suscitadas pelos trabalhos no texto de apresentação da coletiva que será plotado na parede do museu. Ela faz considerações a partir de dicotomias como carne e mente, profano e sagrado, violência e festejo, corpo e “corpa”, repressão e desejo.
“É corpo e sangue que segue sendo derramado e negligenciado como se a ninguém pertencesse e valor não tivesse. É a carne que segue sendo a mais barata do mercado”, arremata Gisele numa menção à música celebrizada pela interpretação de Elza Soares, que nos deixou em janeiro.
Museu Nacional da República
Esplanada dos Ministérios, Brasília (DF).
Visitação de terça a domingo, das 9h às 18h30.
Livre para todos os públicos.
Telefone: 3325 5220
Galeria Térreo
“Paraíso sem Vocabulário”
“Guardadora de Água”
Até 26.6.
A Sala 2
“Para Onde Foi a Espessura da Carne?”
Abertura, 29 de abril, sexta-feira, 19h, até 26 de junho
Até 26.6.
Galeria Principal
“Xingu 57: viagem ao Brasil Central”, fotografias de Domiciano Dias
Até 22.5.
Mezanino
“Envenenada: profanações e polimorfismo tonais”, de Raquel Nava
Até 22.5.
Assessoria de Comunicação da Secretaria de Cultura e Economia Criativa (Ascom/Secec)
E-mail: comunicacao@cultura.df.gov.br